O tempo tem uma importância vital na minha obra. Ele é o cenário invisível no qual eu recrio meu passado trazido à tona pelas cores que traço no universo dos meus personagens. O tempo me diz tudo. Fala da minha experiência de menino, resgata minha memória de adolescente, recorda-me o que fui e acorda-me para o que sou hoje. O tempo cria meu universo paralelo e é ele que me transporta para dentro dos quadros que pinto todos os dias.
Em cada tela vejo-me engolido pelas cenas, me enxergo em cada pessoa, em todas as situações e, como um fotógrafo que aponta a câmera para si mesmo, vou me pintando nas cenas como se todos esses personagens fossem eu. Estou em cada milímetro do que faço, e quando me perguntam “quanto tempo levo para pintar um quadro” respondo: 49 anos.
Eu estou em tudo e tudo sou eu nesse universo paralelo que inventei para mim e para quem me vê.
Cada quadro é uma história, toda tela é minha história.
“José Gonçalves”
Não é exagero dizer que o artista plástico José Gonçalves nasceu pintando. Desde muito criança seu domínio sobre desenhos e cores chamavam a atenção. Aos 11 anos chegou a fazer um curso de pintura, mas o senso comum da época de que no Brasil a arte não garante a vida de ninguém levou o então jovem a cursar a faculdade de arquitetura. “Isso foi há quase trinta anos. Naquele tempo não havia tantos programas de computador e fazíamos os projetos todos desenhados à mão”, conta ele que, depois de formado, trabalhou por quatro anos em escritórios de arquitetura em Londrina, no Paraná. O desejo de pintar, no entanto, permanecia. Foi quando, nos anos 90, José Gonçalves tornou a fazer quadros, mas dessa vez para decorar sua nova casa que ficará pronta. “Foi engraçado porque os amigos chegavam na minha casa e pediam para comprar os quadros. Alguns eu dei, outros vendi, e com isso não parei mais de pintar”, conta ele que acabou sendo estimulado a participar do Salão Banestado, em 1992, de onde saiu premiado. Tranquilo, mas determinado, passou a investir no sonho que logo rendeu frutos. “No final dos anos 90 tive a oportunidade de expor em Modena, na Itália. Depois começaram a aparecer muitas oportunidades”. Atualmente o artista conta com um currículo com exposições pelo Brasil e importantes galerias de arte dos Estados Unidos. Seus quadros estão pelo mundo, o que o deixa muito animado. “Não tenho ciúmes. Acho muito bacana quando vejo um deles indo embora”, entrega. Sobre a vida em Londrina, ele pontua. “Gosto muito da cidade que adotei de coração e não há planos para sair daqui. Acredito que o mundo hoje não impõe distâncias e é possível estar em vários lugares em questão de horas. Depois, gosto da luz e do céu dessa cidade. Talvez, se morasse em outro lugar, minha obra fosse mais cinza”. Animado com o presente com o futuro, José Gonçalves mantém a simplicidade. “Meu trabalho é pintar, meu lazer também é pintar. É assim que sempre vão me encontrar. Fora isso, gosto muito de viajar e não abro mão dos meus exercícios fiscos diários, afinal, pintar uma tela é um super esforço e preciso estar preparado”.
Revista Caras.